O barulho na avenida Paulista é ensurdecedor, volto para casa debaixo de imenso guarda-chuva, o frio chicoteia o rosto e o avermelha, as gotas peitam os corpos, umidecendo aqueles que tentam se proteger, banhando aqueles que nada têm para se cobrir, numa dança cruel, congelante, trêmula. Tento agarrar minha bolsa em busca de calor, mas ela está mais molhada que eu, então a protejo de tanta água. As buzinas ecoam pelos corredores de vento das travessas iluminadas, Bela Cintra e Haddock Lobo com suas grandes e antigas árvores que já testemunharam uma Paulista mais clara, menos cinza, já viram mais céus e menos caos nesta Paulicéia Sem-Controle.
Passo pela Estação Consolação, os carrinhos de mercado com guarda-chuvas pendurados e os homens e mulheres gritando guarda-chuva é cinco real ou capa de chuva, capa de chuva ganham seu pão como podem: em chuva, guarda-chuva, no sol água ou sombrinhas, no jogo de futebol, camisetas e lembranças, na parada gay, leques e vinho barato, em qualquer ocasião, uma mercadoria. A informalidade banha como a chuva, pela falta de opção ou pelas opções indecorosas, inaceitáveis. Entro na rua Augusta, desço ladeando o grande prédio do Banco Safra, reluzente em sua última reforma, elegante e portentoso, passo pelos estacionamentos, mais “informais” vendendo DVDs dos últimos lançamentos do cinema, o Frevinho, os bares da esquina. Ônibus ronronam e entoam com os carros uma cantiga incômoda, um lamento triste, por vezes irado, roncos profundos de motoristas despertos e desesperados com o congestionamento.
Cruzo a Luis Coelho, entro no quarteirão do Espaço Unibanco, recanto de paz em meio a metrópoloucura, em meio à balbúrdia dos bares e cafés da região. Percebo uma turma de garotos e garotas subindo devagar, animados, gesticulando bastante. Páro com meu grande guarda-chuva em frente a um café, numa pequena galeria, e dou passagem para o grupo de jovens que vem rápido, típicos paulistanos. Percebo, quase constrangido, muito maravilhado, como o silêncio acompanhava esses meninos e meninas, nos seus 18, 19 anos. Talvez pelo destino, que quis me trazer segundo de paz em meio, me ilhar das ondas de barulho e confusão, uma feliz coincidência, era uma avalanche silenciosa na rua Augusta, às 20h de uma segunda-feira conturbada pela chuva. Gesticulavam numa animação espantosa, jovens, aquela imagem de excitação e felicidade não coadunava com o silência que eles arrastavam pela movimentada rua. Silêncio gelatinoso, quase materializado, palpável. Jovens bonitos, expressivos, meninas bem vestidas, meninos mais largados, mas mesmo assim bonitos de se ver. Uma conversa muda que me tirou de órbita por alguns segundos, uma felicidade me tomou de assalto em vê-los tão felizes e o silêncio de sua algazarra tranqüilizou meu coração. Sorri e continuei meu caminho, muito diferente daquele que eu começara.
pois eh… ha um potencial de beleza infinito dentro do proprio caos; mas oculto para os sentidos de mtos………..
Vc só esqueceu de dizer q eu tava do seu lado e nem vi nada disso! rs.
Como seria bom se todas as pessoas (inclusive eu, q não consigo ver nada de bom debaixo de uma chuva) conseguissem perceber pequenos momentos de felicidade como vc costuma visualizar!
Pete, adoro quando vc escreve sobre São Paulo!
Fica sempre muito tocante!
Beijo,
Luca