Li a carta do editor na edição de fevereiro da revista mensal da Associação Americana de Tradutores (ATA), a ATA Chronicles, que trata de orgulho e preconceito da nossa tradução. Mark Herman, de Minnesota, fazendo referência a uma coluna escrita por Jost Zetzsche (também presente na edição de fevereiro), diz que “como Jost, ‘aceito totalmente o termo tradução e tenho orgulho de dizer que sou tradutor”‘. Em seguida, Herman comenta como os tradutores são mal vistos, em especial nos EUA, ao ponto de muitos tradutores oferecerem seus serviços sob máscaras e epítetos dos mais diversos, como “globalizador”, “internacionalizador”ou “localizador”. É a tal história do traduttore, traditore fazendo escola por aí, coisa tão de séculos passados, mas que infelizmente ainda se aplicam a alguns, o que acaba tornando fácil a generalização. Em seguida, depois de um discurso inflamado sobre os preconceitos sofridos pela nossa classe, Mark para algumas ‘dicas’ ou ‘comportamentos’ que os tradutores deveriam ter para honrar as páginas que traduzem, discorrendo sobre definições e normas (algumas das quais úteis para se pensar o ser tradutor).
Até aqui, falamos de Estados Unidos, um dos recantos onde mais se utilizam serviços de tradução em todas as áreas, dos mais diversos idiomas para o inglês. E aqui na nossa pátria mãe gentil, como seria a situação dos tradutores?
Laurence Venutti, polêmico teórico da tradução, sempre causa um furduncinho quando fala de (in)visibilidade do tradutor. Sempre duma perspectiva do país hegemônico (sua maneira de eufemizar dos EUA), ele diz que não dá mais para sermos fantasmas tão úteis a todos. Porém, quando falamos de realidades de países não hegemônicos (ou seja, o resto do mundo, em especial os países em desenvolvimento), o tradutor é um ilustre desconhecido, obrigado. Acredito que já comentei aqui sobre a reação da maioria das pessoas quando digo que sou tradutor: ou me perguntam se trabalho em editora, me questionam sobre o idioma ou fazem aquela cara de ‘oh’, que ao pé da careta significa ‘não tenho noção do que esse cara faz’.
Certo, ninguém precisa espalhar aos quatro ventos que é tradutor e que se especializou em plataformas petrolíferas nos idiomas islandês e urdu, mas quando falar de sua profissão, colega, não a desmoralize. Não faça cara de dor de barriga quando disser “Sou tradutor” e nem diga, quando já estabelecido na profissão, “Trabalho com tradução”. Assuma essa bronca (que não é pouca) e fale com orgulho sobre o que você faz e que faz com amor. Profissão tão importante, essa nossa, não pode parecer um bico ou algo do tipo, até porque suamos tanto os dedos e teclados (sem falar no suor real dos intérpretes em suas cabines, fechadinhos, concentrados e falantes) que desmerecer nosso ofício me parece até ofensa. Não é busca de louros e confetes, mas sim do reconhecimento merecido dos tradutores, de quem faz e acontece para tornar o mundo mais acessível para todos.
Se não gosta do que faz ou não se encontrou na profissão, há um milhão de outras coisas que podem precisar do seu esforço. Pode apostar.
Gostei de um trecho da carta de Mark Herman e a traduzo livremente (e por força do hábito) para vocês aqui:
“Primeiro, como Jost, sugiro que nós, tradutores, declaremos com orgulho o que somos sempre e quando possível. Devemos também ressalvar as limitações da tradução automática, ao mesmo tempo que admitimos sua utilidade.“
Não é difícil. A maioria de nós deve ter bastante orgulho do papel que desempenha. Então, mãos à obra. E boca no trombone.
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É isso aí, Petê. Naquelas fichas cadastrais de loja, ou quando vou participar de promoções, sorteios e afins, faço questão de dizer que sou tradutora E intérprete. Às vezes, quando tentam reduzir e optar apenas por uma delas, bato pezinho e insisto mesmo.
Oi Petê!
Sabe, quando digo que sou tradutora e as pessoas perguntam mais, tipo “o que vc traduz?”, eu respondo que sou especialista em software, helps e manuais. Aí sim vem a cara de ponto de interrogação.
Adoro dizer: sabe tudo aquilo que vc vê no programa X? Arquivo, Editar, Exibir, Imprimir, Salvar Como etc.? Então, se não fosse pelo meu trabalho, você veria File, Edit, View, Print, Save As…
Além de todas aquelas telinhas de ajuda que aparecem quando você clica no ponto de interrogação…
Érika e Ana Cristina,
Este é mesmo o caminho, mostrar para as pessoas que estamos por trás de muitas coisas que elas nem imaginam, de acordos, programas, leituras e notícias que elas pensam ter surgido por um encanto (ou por um programa de tradução qualquer). Cada pequeno gesto na direção de esclarecer quem somos e que somos muitos é importante para sermos cada vez mais respeitados. Beijos procês e obrigado pela visita.
Alguns ainda dizem: nossa, nunca tinha pensado que isso é traduzido…
Isso mostra o quanto as pessoas não tem noção de quem somos ou do que fazemos. Tá na hora disso mudar, né?
Gostei do texto, Petê. Eu mesmo admito que adentrei o mundo da tradução achando que eu poderia conciliar com outra atividade, e fui obrigado pelo próprio a me retirar pois não daria conta do recado.
Eu sempre recebi esse tipo de reação, também de pessoas da própria família, quando digo que sou Biólogo (já ouvi comentários como “ah, você quer ser pobre, né?”), ou quando dizia que era professor. As pessoas faziam uma cara de “poxa vida, não conseguiu nada melhor, né…”. É a mesma coisa se nós menosprezarmos outras profissões ditas “inferiores”. Se eu menosprezar uma pessoa por ela ser motorista de caminhão, por exemplo, não vou poder me alimentar, me vestir, tomar banho, já que praticamente todos os produtos que consumimos são transportados na malha rodoviária.
Mais uma vez a mensagem é: vamos tirar o preconceito do automático.
Ótimo texto! 🙂
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Senti falta de mais detalhes sobre a profissão, mas entendo que é um recadinho para os profissionais.
Obrigado, tradutores.
Olá Paulinho,
Obrigado pela visita. Se quiser mais detalhes sobre a vida de tradutor, veja na tag “Aos tradutores” e também nos links sobre tradutores na área de Links deste blogue. Há muitos interessantes, inclusive, um muito ótimo chamado Tradutor Profissional, do Danilo Nogueira e da Kelli Semolini. Vale a pena.