A favor do “textão”?

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Seção científica da biblioteca do Senado dos EUA. Foto de Tom Morris.

Até pouco tempo atrás, eu costumava brincar com os tais “textões” que apareciam na internet, especialmente aqueles que surgiam no Facebook, em geral cheios de lição de moral ou bobagens imensas sobre o assunto da semana – fosse o beijo gay da novela ou a ciclovia do Haddad, passando por “só no Brasil” e o preço do tomate.

Então, pensei o seguinte – uma ideia que nada tem de nova, mas voltou a me assombrar: será que estamos nos tornando a geração dos 140 caracteres. Ou, pior, a geração snapchat? Será que muita gente que tem o que dizer cansou de jogar palavras ao vento e se refreiam, evitando o cansaço dos debates infinitos e sem propósito, enquanto gente que está acostumada a ganhar no grito na vida real transformou essa tendência em textão, ou seja, aparentemente vence pelo cansaço?

Ou será que os textões sempre existiram e agora têm um nome? O que antes era sermão virou textão?

São muitas perguntas que não tenho o intuito de responder com esse texto, que é apenas uma reflexão de um sábado à noite em que, depois de muitas semanas, estou sem fazer nada, sem vontade de sair, como muitos de vocês que estão me lendo agora. Se quiserem tentar respondê-las com outros textos, será muito bacana o diálogo. O que quero é repensar a ideia de textão, que não deveria se tornar sinônimo de coisa chata. Várias vezes já me peguei abrindo o Facebook, vendo a postagem de um amigo com o sedutor “Continue lendo”, abrir e ver páginas e mais páginas de um assunto que poderia ser resumido em… 140 caracteres. Será que poderia mesmo? Dificilmente. E a pessoa tinha o que falar. Claro que há muita bobagem espalhada por aí, mas por que não damos chance para os textões?

Pensei em opções. A pressa? Não creio. Acho que há uma falta de paciência crescente com textos maiores. Li um texto muito bom, traduzido pelo @MediumBrasil, que comenta sobre nossa incapacidade de ler algo que passe de um tamanho razoável, basicamente livros e reportagens maiores. Nossas crianças hoje já não conseguem se concentrar mais que segundos em uma atividade, pois o estímulo de informações já chegou até elas. A não ser que tenham, desde cedo, o costume de ouvir histórias mais longas, incentivo dos pais na leitura e exemplo — sim, gente, exemplo! — , a leitura é a última atividade a que um jovem vai se dedicar.

Voltei ao rascunho deste texto hoje, 8 de agosto, com uma informação que, mesmo já sendo antiga, me traz muita tristeza: 70% dos brasileiros não leram um único livro no ano de 2014 (segundo pesquisa do Fecomércio-RJ). Não é apenas triste para a cultura brasileira, mas para os milhares de profissionais que se dedicam ao livro. Em tempos de crise, sabemos que o primeiro supérfluo a ser descartado é o livro, mesmo com a certeza de que a leitura poderia — em muitos aspectos — ajudar a superar ou a atenuar a crise. Pois livro — como toda a forma de cultura — , apesar de não encher a barriga, aumenta nossas capacidades, inclusive, de encher a barriga depois. Quem lê, se informa, tem conteúdo, acaba se dando melhor, tendo maior desenvoltura no trabalho, maior poder de negociação e discussão em situações mais complexas, enfim, quem lê já está um passo à frente daquele que não lê. No mínimo já tem mais sonhos e aspirações na mente que os demais.

Por isso meus mixed feelings quanto aos textões. Acho que deveríamos prestar atenção neles, quando justificados. Mas, ao mesmo tempo, não percamos tempo demais com eles. Pois os livros estão aí, aos montes, e o mestre Umberto Eco já dizia: não há como ler nem os necessários em uma vida inteira, quanto mais todos os que queremos.

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